22% dos casos de homofobia acontecem em ambiente familiar

Número de mortes de LGBTs em Minas cresceu 16% em apenas um ano 



Na noite do primeiro dia do ano, um estudante universitário de 20 anos, da região do Vale do Aço, foi atacado com socos e golpes de cinto em seu rosto. O agressor foi sua própria mãe, ao descobrir que o rapaz era homossexual. "Ela chorou e disse que eu tinha destruído a vida dela. Ficou com uma ira que eu nunca vi e disse que eu ia morrer", contou o aluno de administração, que acaba de entrar para uma estatística de preconceito e intolerância.

Os casos de violência motivados pela orientação sexual de um membro da família não são raros. Um levantamento feito pelo Centro de Referência da Cidadania LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais Travestis e Transexuais) do Rio de Janeiro mostra que grande parte de LGBTs que sofrem agressão é vitimada no ambiente familiar. Dos 5.070 atendimentos realizados pela entidade, entre julho de 2010 e julho de 2011, 22,4% se tratavam de agressões sofridas em casa, sendo pais, mães e outros parentes os principais autores dos ataques.

Em Minas Gerais, não há estatísticas sobre o assunto, mas o coordenador do Centro de Referência pelos Direitos Humanos e Cidadania LGBT da capital, Carlos Magno, avalia que o dado é preocupante. "É preciso ter uma ação urgente para mudar isso", afirmou.

Acostumada a atender LGBTs em situação de vulnerabilidade, a psicóloga Dalcira Ferrão explica que uma agressão homofóbica sofrida dentro de casa pode ter consequências ainda mais graves para a vítima. "A pessoa fica sujeita a depressão, isolamento social e até suicídio", explicou.

A primeira atitude tomada pelo jovem universitário depois de apanhar da mãe foi sair de casa. "Peguei R$ 100 emprestados com minha irmã e voltei para Belo Horizonte", contou. Ele disse que não quis acionar a polícia e nem foi ao médico, apesar dos hematomas que teriam ficado no peito e no rosto. A mãe, segundo ele, tomou as chaves do apartamento onde ele morava na capital e os cartões de crédito. "Foi uma humilhação emocional grande", disse o estudante.

Procurada pela reportagem, a mãe não quis comentar a versão do filho. "Não tenho nada contra a escolha. Mas aceitar (a orientação do filho) depende da minha religião", disse ela.

O episódio familiar é um dos lados de uma realidade de intolerância presente em Minas Gerais. Balanço do Grupo Gay da Bahia (GGB) revela aumento no número de assassinatos de LGBTs no Estado: 18 LGBTs foram mortos em 2010, enquanto 21 foram assassinados no ano passado. O aumento foi de 16%. "A homofobia é tão impregnada que há mães que preferem que o filho seja bandido ou morra a ser gay", avalia o antropólogo Luiz Mott, fundador do GGB. O levantamento refere-se apenas a assassinatos.

Amigos organizam festa em apoio a jovem
Foi no boca a boca que a agressão homofóbica sofrida pelo estudante virou assunto na capital. O fato chegou ao conhecimento de amigos de amigos e rapidamente uma rede de ajuda foi formada em Belo Horizonte. Através das redes sociais, uma festa foi organizada para arrecadar fundos em apoio ao universitário, que começou ontem em um novo emprego.

"Fiquei chocado quando soube e pensei em uma forma de conseguir dinheiro para ajudar. Disseram que ele não tinha nem lugar para morar", disse o jornalista Rafael Sandim, 21, organizador da festa.

Minas é o quarto Estado em número de homicídios
21 LGBTs assassinados em 2011 em Minas deixam o Estado no quarto lugar entre os que mais registram mortes por atos homofóbicos. Os homicídios por intolerância ainda são em maior número na Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro. As estatísticas podem ser ainda maiores, já que o Grupo Gay da Bahia (GGB), entidade que realiza o levantamento anual, registra apenas casos que foram divulgados pela imprensa.

O bom relacionamento entre pais e filhos LGBTs é tido como fundamental para evitar atos de violência dentro da família, segundo a integrante do grupo Mães pela Igualdade Jiçara Martins, 61. O grupo é composto por mães de LGBTs que oferecem apoio aos pais que descobrem a orientação das/dos filhas/os. "Acho que deixar a verdade prevalecer é sempre a melhor opção. Tem casos de pais que, ao saber que o filho é gay, têm reação momentânea e explodem, mas a gente tenta ajudar", disse. Além da violência física, ela relata casos comuns de agressões verbais. "Tem a violência velada, comentários, olhares. Isso pode levar uma pessoa ao suicídio", afirmou.

O maior entrave na aceitação familiar, segundo Jiçara, é o medo que os pais têm de assumir que o filho é homossexual. "Tirar os pais do armário é o mais complicado".

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