Relembre os personagens LGBTs que fizeram sucesso


A evolução dos personagens homossexuais nas novelas brasileiras

Por Lufe Steffen

Exibida às 21h na Rede Globo, a novela "Insensato Coração" vem fazendo um trabalho revolucionário, denunciando a homofobia social e defendendo os personagens gays da trama.

Eles não são poucos: cinco personagens homossexuais fazem parte da história, e mais um entra no ar em breve. Com esse time, os autores Gilberto Braga e Ricardo Linhares buscam abordar um assunto que ainda é tabu, e tentam destruir o preconceito reinante.

Desde o início da novela, os espectadores vêm assistindo às peripécias de Eduardo (Rodrigo Andrade), que começa a se envolver afetivamente com o professor Hugo (Marcos Damigo), além de conviver com Xicão (Wendel Bendelack) e Nelson (Edson Fieschi). Sem falar no alucinado Roni (Leonardo Miggiorin), o assistente e melhor amigo de Natalie (Deborah Secco).
Foto: TV Globo/ João Miguel Júnior

Leonardo Miggiorin como Roni, o assistente de Natalie (Deborah Secco) em "Insensato Coração"
Nas próximas semanas, o ator Miguel Roncato, que interpretou Alfredo na novela "Passione", entra na história em rápida passagem. Seu personagem será assassinado por jovens playboys cariocas, apenas por ser gay. Com isso, os autores pretendem escancarar ainda mais o problema da homofobia, representado nas falas do preconceituoso Kléber (Cássio Gabus Mendes). E até Rony quase foi vítima: no capítulo dessa sexta-feira (01), ele foi perseguido por homofóbicos, mas escapou ileso.

No Passado
Foto: Reprodução

Buza Ferraz, Bete Mendes e Ziembinski no clássico "O Rebu", de 1975
Mas nem sempre a TV se esforçou para diminuir preconceitos. No passado, os personagens LGBTs apareciam de forma nem sempre louvável. Muitas vezes, eram mostrados como tipos de caráter duvidoso, cujas sexualidades eram vistas como algo doentio, ou usados para fazer humor.

No primeiro caso, pode ser incluída "O Rebu", novela exibida pela Globo em 1975 no horário das 22h. O milionário Conrad Mahler (Ziembinski) tinha um caso obscuro e meio marginal com o garotão Cauê (Buza Ferraz). Mahler termina matando Sílvia (Bete Mendes), por ciúmes do namoro dela com o rapaz.

Foto: TV Globo/Eduardo Nadar

Seu Peru (Orlando Drummond), veterano dos programas de humor
No departamento do humor, inúmeros programas da TV sempre mostraram personagens bem afeminados, coloridos e escandalosos, estereotipando os gays. O mais famoso é o Seu Peru (Orlando Drummond), da "Escolinha do Professor Raimundo". Mas houve também a clássica Vera Verão, de "A Praça é Nossa", interpretada pelo já falecido Jorge Lafond. Tais personagens viviam disparando frases de duplo sentido, e estavam sempre interessados em sexo.

Nas novelas, os gays muitas vezes eram mordomos afetados. Os principais: Everaldo (Renato Pedrosa) em "Dancin' Days" (1978), Eugênio (Sérgio Mamberti) em "Vale Tudo" (1988) e Jacinto (Cláudio Curi) em "Roda de Fogo" (1986) - Jacinto tinha um caso repleto de lances sadomasoquistas com seu patrão, Mário Liberato (Cecil Thiré).

Foto: Reprodução

Eugênio (Sérgio Mamberti), o mordomo de Helena (Renata Sorrah) em "Vale Tudo"
Mas se "Vale Tudo" tinha o caricato Eugênio, havia também na novela o casal de mulheres Cecília (Lala Deheizelin) e Laís (Cristina Prochaska). Cecília acabou morrendo, mas Laís encontrou um novo amor: Marília (Bia Seidl). E o principal autor de "Vale Tudo" (atualmente em reprise no Canal Viva), não por acaso, era Gilberto Braga.

Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Sílvio de Abreu

Gilberto acabou se especializando em criar personagens LGBTs. Praticamente em todas as suas obras existem representantes da comunidade. Mas além dos mordomos Everaldo e Eugênio, ele também escreveu gays mais discretos.

O primeiro deles foi Inácio (Dennis Carvalho), de "Brilhante" (1981). Atormentado pela repressão da mãe (Fernanda Montenegro), Inácio se envolveu com o personagem de João Paulo Adour, foi obrigado a se casar com Leonor (Renata Sorrah), mas terminou ao lado de um novo namorado (Buza Ferraz, novamente).

Em "Paraíso Tropical" (2007), Gilberto investiu em um casal gay bem-sucedido e discreto. Rodrigo (Carlos Casagrande) e Tiago (Sérgio Abreu) eram executivos que viviam juntos e não tinham nenhum problema de ordem sexual. E todo o círculo social e profissional do casal aceitava com bons olhos o romance.

Outros autores preocupados em abordar o tema: Sílvio de Abreu e Aguinaldo Silva. Aguinaldo criou Bernardinho (Thiago Mendonça), o simpático carnavalesco de "Duas Caras" (2007), que viveu abertamente suas paixões, e terminou ao lado de Carlão (Lugui Palhares).

Foto: TV Globo

Thiago Mendonça e Lugui Palhares em "Duas Caras"
Aguinaldo também criou, em "Suave Veneno" (1999), o guru gay Uálber (Diogo Vilela), sempre assessorado por Edilberto (Luís Carlos Tourinho). Os personagens receberam críticas de militantes LGBTs, pois estariam reforçando estereótipos de que os gays seriam "afeminados".

Sílvio de Abreu foi pioneiro ao colocar, de forma aberta, um jovem casal gay em "A Próxima Vítima" (1995). Os hoje clássicos Sandrinho (André Gonçalves) e Jefferson (Lui Mendes). Apesar de um episódio negativo - o ator André Gonçalves foi agredido no banheiro de uma boate carioca, por causa do personagem -, os dois tiveram boa aceitação pública e terminaram juntos.

O mesmo não aconteceu com a próxima iniciativa de Sílvio no assunto. O casal Leila (Sílvia Pfeiffer) e Rafaela (Christiane Torloni), lésbicas bonitas, ricas e bem-sucedidas, foram rejeitadas nas pesquisas de opinião. E terminaram indo pelos ares na explosão do shopping que dava cenário à novela "Torre de Babel" (1998).

Beijo Lésbico
Foto: Divulgação/SBT

Luciana Vendramini e Giselle Tigre: o beijo pioneiro de "Amor & Revolução"
Apesar do trauma de "Torre de Babel", as mulheres acabaram avançando mais no quesito da aceitação popular. E assim, os casais Clara (Alinne Moraes) e Rafaela (Paula Picarelli) de "Mulheres Apaixonadas" (2003), e Jennifer (Bárbara Borges) e Eleonora (Mylla Christie) de "Senhora do Destino" (2004), tiveram sucesso.

Todas essas personagens lésbicas eram retratadas de forma sutil, com muita feminilidade e modernidade - fugindo dos esterótipos de mulheres masculinizadas, que vigorava no passado. O resultado desembocou no primeiro beijo entre duas pessoas do mesmo sexo da teledramaturgia brasileira: Marcela (Luciana Vendramini) e Marina (Giselle Tigre) em "Amor & Revolução", no ar no SBT.

Beijo Gay 
Foto: TV Globo

Bruno Gagliasso e Erom Cordeiro em "América": o quase-beijo mais famoso da TV
Enquanto as lésbicas conseguiram se beijar, os gays continuam aguardando a vez. Júnior (Bruno Gagliasso) e Zeca (Erom Cordeiro), o casal country de "América" (2005), terminaram juntos, mas sem beijo. O mesmo ocorreu com Julinho (André Arteche) e Thales (Armando Babaioff) na recente "Tititi" (2010).

Mas, independente do tão aguardado beijo, o fato é que os gays na TV mudaram muito e hoje são mostrados com naturalidade, como pessoas comuns - e conquistando a confiança do público e de alguns personagens conservadores das tramas. Como foi o caso de Julinho: o cabeleireiro cativou a rígida Bruna (Giulia Gam), mãe de seu falecido namorado, Osmar (Gustavo Leão), e conseguiu mudar a mentalidade da sofrida personagem - a ponto de ela passar a considerar o rapaz como o filho que perdera.
Foto: Alex Carvalho/TV Globo

André Arteche, o Julinho de "Tititi"
Apesar de tanto avanço, ainda aparecem nas novelas certos gays que preferem mudar de rumo. Orlandinho (Iran Malfitano), de "A Favorita" (2008), era gay, mas terminou se casando com a amiga Mariazinha (Deborah Secco).

Politicamente Correto x Incorreto
Foto: TV Globo/Divulgação

André Gonçalves como Áureo, o gay exuberante de "Morde & Assopra"
Diante desse cenário, abriu-se novamente a possibilidade de personagens gays não tão "bonzinhos" ou politicamente corretos. Assim, Aguinaldo Silva criou Carlo (Pierre Baitelli), um "gay do mal", na minissérie "Cinquentinha" (2009). Carlo voltou ao vídeo na atual "Lara com Z". Também retornaram os gays mais afeminados, como o Áureo (André Gonçalves, intérprete do pioneiro Sandrinho), que está no ar às 19h, em "Morde & Assopra".

Já os programas de humor continuam na mesma linha do passado. O milenar "Zorra Total", no ar desde 1999, já teve o Alfredinho (Lúcio Mauro Filho), cujo comportamento envergonhava o pai (Jorge Dória), e hoje investe em Valéria, ex-Valdemar (Rodrigo Sant'anna), cujo bordão é "Ai, como eu tô bandida!". Uma volta ao passado?
Foto: TV Globo

Carlo (Pierre Baitelli), o "gay malvado" de "Cinquentinha" e "Lara com Z"
Na linha dos gays ambíguos, volta ao ar Felipe Cerqueira. Criado por Janete Clair na novela "O Astro" (1978), Felipe foi interpretado por Edwin Luisi e era um personagem conturbado: problemático, viciado em drogas e bissexual, namorava Clô (Tereza Rachel) e acabou matando o marido dela, Salomão Hayala (Dionísio Azevedo), ajudado pelo amigo Henri (José Carlos Rodi).
Foto: AgNews

Henri Castelli e João Baldasserini no remake de "O Astro"
"O Astro" ganhou remake, que estreia no próximo dia 12 de julho. E nele, Felipe volta na pele de Henri Castelli - e continua "perigoso". Se na primeira versão da novela a sexualidade de Felipe era misteriosa, na atual ele de fato mantém um caso com o cabeleireiro Henri (João Baldasserini) - as primeiras fotos da dupla foram divulgadas há algum tempo -, e se envolverá com a Clô da vez: Regina Duarte. Resta saber se ele continuará sendo o assassino de Salomão.

Na dúvida, "Insensato Coração" continua em sua cruzada quixotesca para retratar os LGBTs de forma atual, moderna e livre de preconceitos, levando ao ar um texto corajoso e humanista - e esperando que a mensagem seja entendida pelo grande público.
Foto: TV Globo

Marcos Damigo e Rodrigo Andrade: Hugo e Eduardo, representantes gays em "Insensato Coração"

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